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segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Quarta-feira de cinzas


Já bem descansado do carnaval que a pouco passou e por mim nada foi vivido. Acordei cedo na quarta-feira de cinzas e fui à padaria que não é de nenhum português é sim de um nordestino, cabra valente que já ouvi até dizer que havia matado um homem que brincou dizendo que padeiro gostava de queimar a rosca, mas bem isso deixemos para o tribunal julgar.
Como ia dizendo. Acordei cedo, comprei o jornal e fui até a padaria do Sr. Bicó tomar um café pingado, sentei-me no balcão, lá pelas tantas sentou-se ao meu lado uma mulher que parecia ter sido esculpida por Deus em um dia em que Ele não tinha nada para fazer e pode esculpi-la com toda calma do mundo, percebi isso devido a perfeição em corpo e rosto de mulher.
Como sou homem e heterossexual, claro que olhei detalhadamente para o corpo que era de curvas perfeitamente bem coladas, daquelas em que os dedos do homem poderiam escorregar durante dias e ainda assim não se satisfazer, olhei o rosto delicado, porém com alguns traços fortes que não escondiam a experiência que ostentava mas que não negava a sublime beleza, acredito que tinha por volta de trinta anos, até então só tinha observado-a com olhar atento de homem a caça, até que os olhos da linda mulher chamou-me mais atenção do que seus atributos carnais.
Os olhos compridos e esverdeados pareciam tentar esconder-se por trás dos grandes cílios, mas mesmo assim percebi devida minha alma de escritor que algo de triste pairava por sobre aqueles verdes olhos, achei rapidamente que eu já havia visto aqueles olhos, mas acredito que isso pode sim ter ocorrido, mas nos meus sonhos!
A moça pediu uma água com gás, percebi que uma lágrima correu em seu rosto que agora estava pálido, pensei em sair correndo daquela padaria, pois eu mesmo já tivera sofrido demais nos quatro dias de carnaval e havia buscado na quarta-feira de cinzas um bálsamo, um alívio para minhas frustrações, então não poderia entristecer-me ou envolver-me com as tristezas e amarguras das demais pessoas, mas não resisti e não sai correndo fiz exatamente o contrário, retirei do bolso um lenço e ofereci a jovem para que enxugasse suas lágrimas, obviamente já estava eu envolvido, ela aceitou enxugou seu leve pranto, eu reparei que ela enxugou as suas lágrimas com uma delicadeza que eu outrora já havia visto em alguém que agora não lembro quem, mas certamente já havia visto, a jovem e linda mulher disse-me seu nome, era Anita e contou-me também que a mãe dera-lhe esse nome em homenagem a Anita Garibaldi que era uma guerreira e queria que a filha assim o fosse, não compreendi pois ao falar da mãe a garota parecia mais triste, então questionei se a mãe já era falecida, a resposta veio fria, seca e pesada e disse-me que sim, não sei nem como vou explicar mas aquele sim me feriu de morte, não sei o que me deu mas senti que ficara mais sozinho, mesmo assim continuei a falar com Anita, um nó ainda estava preso em minha garganta tentava respirar e não conseguia, julguei que esses sintomas deveria ser devido ao leite pingado que acabara de tomar pois não tinha outro motivo. Anita falou-me que a mãe morrera a pouco e que ela estava aqui em Fortaleza para realizar um último pedido que a mãe assim a fizera, mas que por ela ser fraca passou os quatro dias de carnaval, trancafiada num quarto de hotel tomando coragem, mas o que conseguiu foi alimentar ainda mais seu medo, como sou super curioso perguntei sem a menor discrição qual tinha sido o pedido de sua mãe, prontamente Anita contou-me entre lágrimas que a mãe havia lhe pedido que ela fosse conhecer seu pai, pois a mãe nunca contara a ele que havia engravidado devido o pai ser um porra-louca, mas agora queria muito que a filha o conhecesse, pois acreditava que devido a idade ele já poderia estar mais responsável e talvez pudesse ser verdadeiramente um pai, ao terminar de contar-me sua história observei suas mãos e estavam tremulas, os olhos perdidos e a voz embargada. 
Um vento forte invadiu a padaria meu lenço voou da mão de Anita foi então que ela levantou-se e caminhou até o lenço que agora repousava no chão, naquele momento lembrei-me do modo como ela enxugava as lágrimas, dos gestos delicados, dos olhos esverdeados e agora vendo seu andar cheio de classe, mas pouco esnobe, constatei que Anita era filha de Ana, um grande amor que vivi no carnaval de 1979 na hora não consegui falar nada, não pensava mais nada eu parecia estar perdido num plano astral onde não existiam paredes, amarras, gostos ou cheiros até que senti os olhos verdes a observar-me, era Anita que tinha voltado a sentar-se ao meu lado, foi então que fiz o que deveria ter feito, olhei bem em seus olhos verdes e disse-lhe com toda emoção:
__ Perdão minha filha, mas prometo estar sempre ao seu lado.
Anita respondeu-me:
__ Agora posso abraçar a materialização dos meus sonhos? Você pai. 
Abracei-a com todo amor e carinho e pela primeira vez chorei!

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